segunda-feira, 31 de maio de 2021

A temática do negro em músicas de Gilberto Gil

 Por - Pedro Augusto V. L. Soares


A música enquanto discurso sonoro é produto de um contexto histórico, pois, o compositor capta através de sua arte as tensões vivenciadas pela sociedade tornando-a um veículo para exposição de ideias. Na intenção de identificar a temática do negro em músicas populares, selecionei dentre as canções de Gilberto Gil algumas que tratam desta questão. 

Neste contexto, Gilberto Gil, em A Mão da Limpeza, convoca o ouvinte a usar a imaginação ao utilizar da narrativa tecendo suas memórias com o fim de transmitir os fatos para gerações seguintes e assim desconstruir a imagem criada pelo outro, pelo branco: 

 

O branco inventou que o negro

Quando não suja na entrada

Vai sujar na saída, ê 




 

O compositor coleta os fatos da história do povo africano nas Américas e ao articular o tema constrói o discurso poético negro – os acontecimentos mostrados, a rememoração de um passado coletivo e tece um dos caminhos para a construção de uma identidade cultural. O uso do “Ê” não possui apenas o efeito sonoro, este som remete ao imaginário coletivo e traz de volta as origens africanas. 

 

Gil insiste sobre a veracidade dos fatos e tece a sua versão: 

 

Na verdade a mão escrava 

Passava a vida limpando

O que o branco sujava, ê

Imagina só

 

O discurso poético negro é constituído pela sua história, afinal a busca da identidade se faz também pelo caminho da cultura partilhada, uma ancestralidade, uma história em comum. Na letra ainda temos a maneira como o povo negro foi posicionado e sujeitado pelos regimes de representação dominantes. 

 

Mesmo depois de abolida a escravidão 

Negra é a mão 

De quem faz a limpeza

Lavando a roupa encardida, esfregando o chão

 Negra é a mão, é a mão da pureza

 

 

O processo de formação de classes tem certas particularidades no Brasil. Extinta a escravidão, a ideia corrente é que os negros foram automaticamente formar o proletariado das cidades que se desenvolviam, e em pé de igualdade com outras levas proletárias constituídas em sua maioria de imigrantes. Na verdade, já estava instaurado o preconceito racial, inclusive na própria classe proletária. Os negros saídos das senzalas não se incorporavam automaticamente à classe operária. O negro e outros não-brancos vão compor a grande parcela dos marginalizados decorrentes das relações sociais que substituíram o escravismo. Privilegia-se, por exemplo, a mão de obra imigrante e empurra-se o negro para baixo, para os piores setores da economia. 

 

Nesse processo o negro é logrado socialmente e apresentado como incapaz para trabalhar como assalariado. Nasce aí o mito da incapacidade do negro para o trabalho. O negro seria a partir dessa percepção racista visto como indolente, cachaceiro, não persistente. Enquanto o branco seria o trabalhador ideal. Em um momento da nossa história social, após a oficialização do fim do regime escravista, houve uma coincidência entre a divisão do trabalho e a divisão racial do trabalho. O que gerou o predomínio do branco em certos tipos de atividades e em outros os negros e seus descendentes. Temos assim que todo trabalho dito “qualificado”, “intelectual”, “nobre”, “limpo” era exercido pela minoria branca, ao passo que o subtrabalho, o trabalho não qualificado, braçal, subalterno é praticado pelo escravo e depois pelos negros livres. 

 

Negra é a vida consumida ao pé do fogão

Negra é a mão

Nos preparando a mesa

Limpando as manchas do mundo com água e sabão

Negra é a mão

De imaculada nobreza

 

Esta divisão de trabalho persiste até os dias atuais como parte dos resquícios de um sistema colonial e escravista. E assim a mobilidade social do negro descendente do antigo escravo é pequena. Seguindo Patrícia Hill Collins nas imagens de controle trazidas por Winnie Bueno (2019), o negro foi praticamente imobilizado pelos mecanismos sociais que as elites estabeleceram. 

 

A poesia negra é constituída pela reversão dos valores e avaliação do outro. A lei maior da negritude é mostrar como positivo tudo que era julgado como negativo. Não apenas nas características físicas, também nos aspectos históricos e culturais. Tudo deve ser dito e dito com exaltação. É nessa linha que segue Gilberto Gil ao desconstruir a imagem estereotipada sobre o negro. E esta é a intenção do compositor ao trazer para os versos iniciais de A Mão da Limpeza o dito popular e dar-lhe um sujeito enunciador – O branco. 

 

O branco inventou que o negro 

Quando não suja na entrada

Vai sujar na saída, ê

Imagina só! 

 

E o estereótipo é desconstruído: 

 

Na verdade, a mão escrava 

Passava a vida limpando

O que o branco sujava, ê

 

Uma distinta oposição entre identidade criada pelo colonizador e a realidade. O branco inventou... Na verdade, a mão escrava. 

 

A identidade e a consciência étnica são penosamente escamoteadas pelos brasileiros. Os censos do país já registraram diversas denominações diferentes que o brasileiro usou para fugir de sua verdade étnica e aproximar-se do modelo tido como superior. 

 

A ideologia do branqueamento nos remete ao século XIX. O colonizador português que com o seu sistema classificatório possibilitou a “categoria mulato” – para diferenciar o negro mais claro, portanto superior. Isso constituiu uma fragmentação da identidade étnica e que determinará a impossibilidade de surgir uma consciência mais abrangente do segmento negro e não branco. 

 

Gil em Sarará Miolo, com os versos irônicos, por um lado, e imperativo por outro, chama atenção para consciência da identidade étnica 

 

Sara, sara, sara, sarará

Sara, sara, sara, sarará

Sarará miolo 

Sara, sara, sara, cura 

 

O não branco luta para mascarar suas matrizes étnicas com os valores criados para discriminá-lo. 

 

Sara, sara, sara cura

Dessa doença de branco

De querer cabelo liso

Já tendo cabelo louro

Cabelo duro é preciso

Que é para ser você, crioulo

 

O “cabelo pixaim” é abominado pelo não-branco e ele luta para escondê-lo. Mas Gilberto Gil conclama: 

 

Sara, sara, sara cura

Dessa doença de branco, 

 

E anuncia a lei maior da negritude, valorizar, mostrar como positivo tudo que era desvalorizado. É desta forma que Gilberto Gil traz o discurso do negro e o desejo de um novo olhar para aquela representação que se convencionou ao longo do tempo. 



Resenha crítica produzida como atividade do componente curricular - Jornalismo e Cultura Brasileira ministrada pela profa. Helen Campos.


REPRESENTATIVIDADE NEGRA NA TV BRASILEIRA

 Por - Enzo Matheus


      A televisão brasileira existe desde 1950 e nela se tem muita história que retrata inclusive as relações raciais que atravessam a constituição do país. Podemos falar da TV em grandes matérias jornalistas, entretenimento, publicidade, o universo televisivo é vasto. Mas hoje falaremos sobre a representatividade negra nas telenovelas, o porquê de atrizes e atores terem sido convidados geralmente para encenar personagens que passeiam por dois polos, ora de coitadinho, sempre vitimados seja economicamente ou socialmente ou como bandido, retratando cenas de violência. É importante ressaltar que as novelas muitas vezes só retratam o preconceito velado na sociedade, embora hoje na atualidade alguns atores e atrizes negros e negras, já ocupem papéis de destaque nos enredos, mas ainda é pouco para uma sociedade majoritariamente negra. 

    Conforme Joel Zito Araújo, seja em seu doc. "A negação do Brasil" ou em seu texto "O negro na dramaturgia, um caso exemplar da decadência do mito da democracia racial Brasileira" (disponível em <https://www.scielo.br/j/ref/a/9ZGKYRnVx8rmgZDYs6NBrVv/?lang=pt ) o Brasil por si é uma sociedade racista, embora muitos fechem os olhos e digam que não existe racismo, as narrativas escancaram imaginários construídos sob uma lógica racista e sexista. O negro brasileiro ainda encontra dificuldade para ocupar grandes cargos, pelo contrário, em sua maioria a partir de uma cultura capitalista são subjugados a contextos econômicos empobrecidos e muitos vivem de empregos informais. Nesse sentido podemos concordar que as novelas têm razão, pois elas só revelam um pouco da realidade desse povo. Mas por outro lado, podemos refletir o quanto essas narrativas contribuem na manutenção dessa situação, alimentando imaginários onde alguns corpos são naturalizados como protagonistas e outros como papeis secundários e de pouca relevância.





Estereótipos e pré-definição de imaginários

    Ao olharmos para a história da televisão brasileira, podemos ver vários grandes artistas negros que tiveram suas trajetórias ocultadas ou pouco visibilizadas. O porquê deles quase nunca serem os protagonistas, ser o empresário, o chefe? Poucas vezes foram, e quando foram, sempre foram vistos com olhares de desconfiança. Essa desconfiança vem porque os estereótipos para as pessoas negras já são definidos e, quando se tem um negro fugindo dos padrões, isso causa um espanto. 

    Os estereótipos racistas foram definidos para o negro como: o que gostava do samba, empregado(a), bandido ou coitadinho, além de outros cargos. Se os meios de comunicações e, principalmente as novelas que são um dos principais produtos consumido na TV brasileira passa esse modelo, como mudar isso cabeça das pessoas? É preciso descolonizar o imaginário do próprio negro desconstruindo a naturalização e a conformação com essas situações. 


Breve histórico de novelas brasileiras em que atores e atrizes negros(as) tiveram protagonismo


    Desde a década de 1960, início das telenovelas brasileiras, a participação de atores e atrizes negras evoluiu pouco. Nos anos 1960, os negros somente atuavam interpretando afro-brasileiros em situações de total subalternidade, sendo a mulher constantemente colocada no papel de escrava ou empregada. Nessa época, as telenovelas procuravam confirmar o mito da democracia racial brasileira e da convivência pacífica entre as raças. Os galãs e mocinhas frequentemente eram brancos e loiros.

    Na década seguinte, os anos 1970, as novelas tinham como foco mostrar os conflitos e dramas dos brasileiros na luta pela ascensão social, na década do milagre econômico. Foi apenas nos anos 1990 que uma atriz negra (Taís Araújo) desempenhou o papel-título em uma telenovela, Xica da Silva. Em 2004, a mesma atriz protagonizou Da cor do pecado, da Rede Globo, sendo a primeira protagonista negra da história das novelas da emissora.

    Da Cor do Pecado, Taís Araújo foi protagonista ao lado do seu futuro marido, Lázaro Ramos. Mas ambos, mesmo sendo protagonistas, eram vistos com olhares de desconfiança. Lázaro interpretando Foguinho, assumiu a presidência da empresa, mesmo assim ele era desrespeitado por alguns funcionários. A desconfiança era grande em cima deles, mas essa desconfiança não só era pelo jeito extrovertidos deles, também e especialmente pela cor de pele. 

    Ainda hoje, onde o racismo é combatido com mais força do que no passado, o negro continua sendo pouco representado. De 1960 até hoje, em nenhuma novela o negro foi o protagonista onde não tivesse dúvida do caráter dele.

    A religião com raizes afro descendentes é outro exemplo de desrespeito. Quantas vezes já não assistimos novelas em que se tenha preconceito contra religião de matrizes africanas, onde se tem um olhar de desdém, como se fosse uma religião voltada para bruxarias. O estereótipo criado é inclusive de que só pessoas negras fizessem parte dessa religião.

    A última novela, e talvez a única onde tivemos negros e negras com cargos e ambições maiores dentro de uma empresa, foi na novela Bom Sucesso. Onde muitos negros trabalhavam em uma livraria, que, embora eles não fossem o dono, mas ocupavam papéis grandes. A livraria lançou até um livro de uma escritora negra.


Papel das telenovelas no combate ao racismo


    O sonho de todos é uma sociedade mais justa. As telenovelas hoje conseguem incluir pessoas afrodescendentes, porém o desejo de muitos são essas pessoas ocupando papéis e cargos de destaques. Não e só ser o protagonista sendo um pobre, que se apaixona pelo rico e almeja grandes objetivos na vida. É ser o protagonista desde o começo, podendo ter bons empregos e não sendo subordinado. Se quisermos um Brasil menos racista, as telenovelas podem ter uma grande contribuição para esse desenvolvimento. 

    Devido ao alcance de público, as telenovelas e séries, bem como as propagandas, são responsáveis por elaborar e propagar modelos identitários que serão referência para o espectador. Por isso, é necessário que haja uma equidade racial, no sentido de fazer com que a ideologia do branqueamento e o desejo de euro-norte-americanização não dominem a maior parte representativa da TV.


Resenha crítica produzida como atividade do componente curricular - Jornalismo e Cultura Brasileira ministrada pela profa. Helen Campos.


RESENHA SOBRE EPISODIO - Grey’s Anatomy 14x10 - “Personal Jesus”

Por - Ana Beatriz Batista 

Grey’s Anatomy é uma série exibida tanto pela TV em canais fechados como em plataformas streaming como o Netflix. O enredo se passa em um hospital, num drama médico norte-americano, onde se retrata a vida de médicos protagonistas e suas situações do cotidiano profissional. A serie em muitos episódios retrata e discute sobre o racismo e as consequências dele tanto individualmente para as personagens como para a sociedade. racismo e a discriminação étnica nos Estados Unidos têm sido um grande problema desde a época colonial e escravista do país. 

O episódio "Personal Jesus" mostra a cena de um casal de cirurgiões negros, ensinando ao seu filho de apenas dez anos como agir em uma abordagem policial, e o que nunca fazer para ele não sofrer as consequências do racismo e da injuria racial. Nele a cirurgiã Bailey e seu marido Ben, ensinam ao seu filho a assim que os policiais o abordarem, ele falar o nome todo, sua idade, mostrando assim que ele não tem nada que possa machucar os policiais e sempre manter as mãos para o alto sem fazer nenhum tipo de movimento rápido ou correr, e o mais importante sempre narrar o que ele vai fazer antes de fazer. Para que os policiais não se assustem e atirem nele, pedem que ele seja respeitoso e educado e mostrar um documento de identificação como a identidade. 

Esse episódio chocou bastante seus telespectadores, mas mal sabe eles que isso é infelizmente a realidade da população negra. A partir dessas cenas contextualizadas na cultura norte americana, discuto como essa narrativa pode provocar importantes reflexões sobre o racismo também no Brasil. 





RACISMO NO BRASIL: aproximações e diferenças a partir das cenas em Grey´s Anatomy

A serie retratou bem o cuidado e a preocupação das mães negras sejam elas americanas ou brasileiras, tem com seus filhos e filhas, os orientando sempre sobre como agir e o que falar. No Brasil, a maioria dos jovens abordados pela policia sempre tem o mesmo perfil e a mesma cor, jovens negros que são vistos pela sociedade como ladrões ou ate mesmo traficantes, a cena da serie é vivida por milhares de jovens negros todos os dias. O que Bailey e seu marido ensinam ao seu filho é o que as mães negras no Brasil fazem todos os dias, ensinam e rezam para que seus filhos voltem para casa com vida, para que aquele RG em mãos o tire de uma encruzilhada e que ele volte para seus braços sã e salvo.

As mães e os pais negros, aconselham seus filhos de como agir, falar e pensar perto de policiais, os aconselham sempre a ter seu RG em mãos, e sempre agir com muita cautela. Pois um movimento em falso pode valer uma vida. A importância de seguir o que é falado pelos pais é de extrema necessidade, as mãos para cima, se ajoelhar e falar seu nome todo e se manter imóvel é necessário demais para que aquilo não se torne cena de um crime ou até mesmo uma prisão sem motivo.

  O Brasil por si é uma sociedade racista, devido seu histórico colonial e escravista que ainda hoje deixa resquícios em sua estrutura social, embora muitos fechem os olhos e digam que não existe racismo. 

Logo, desde de pequeno um jovem negro é ensinado que sua vida vale menos do que o de um jovem branco, e que todo cuidado é pouco ao sair, ao falar e ate mesmo ao se vestir. A vestimenta não importa muito na hora dele ser abordado ou ate mesmo morto, quantos jovens foram mortos voltando da escola, do trabalho ou até mesmo da igreja. 

 O racismo e a questão geracional 

Não é possível determinar uma idade precisa para a ocorrência de maior violência sofrida por parte de pessoas negras, apesar de diversos estudos acadêmicos ou feitos pelos movimentos negros . Mães orientam seus filhos desde de pequenos a como agir, a criança já cresce tendo medo da polícia e da lei, policia essa que na teoria era para defender a população.

Bala da polícia só acha um caminho, que é no peito do jovem negro, muitas vezes trabalhador e que a mãe está esperando para tê-lo novamente seguro e em casa. Ainda hoje, onde o racismo até é combatido com mais força do que no passado, mas isso não significa que não exista racismo e que as pessoas não sofrem com ele, significa que os negros estão tendo mais voz e mais direitos e finalmente conseguindo aos poucos e com muita luta o seu espaço na sociedade.


 "É o racismo que opera quando policiais usam violência contra quem consideram suspeitos. Cerca de 75% das pessoas que foram mortas em intervenções policiais eram negras, segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, com dados de 2017 e 2018. Pesquisas acadêmicas conduzidas pela professora e socióloga Jacqueline Sinhoretto, do Grupo de Estudos sobre Violência e Administração de Conflitos da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) acerca do comportamento da polícia em abordagens, mostra que há uma enorme diferença de tratamento e uso da força contra negros em relação a não-negros na prática cotidiana do policiamento e que a filtragem dos “suspeitos” feita pela polícia tem como base a cor da pele." <https://www.geledes.org.br/um-ano-da-morte-de-floyd-antirracismo-precisa-avancar-tambem-no-brasil/>


O que é o racismo  


Racismo é a denominação da discriminação e do preconceito (direta ou indiretamente) contra indivíduos ou grupos por causa de sua etnia ou cor. É importante ressaltar que o preconceito é uma forma de conceito ou juízo formulado sem qualquer conhecimento prévio do assunto tratado, enquanto a discriminação é o ato de separar, excluir ou diferenciar pessoas ou objetos.

O racismo é um problema que afeta o Brasil desde a sua formação. Passamos entre os séculos XVI e XIX por mais de 300 anos de escravização de africanos e seus descendentes que nasceram aqui. Mesmo com o fim da escravidão em nosso país, não podemos dizer que houve, alguma vez, a verdadeira igualdade racial no Brasil.

Mais informações sobre racismo no texto do prof.Kabengelê Munanga "Uma abordagem conceitual das noções de raça, racismo, identidade e etnia" - Disponível em https://www.geledes.org.br/wp-content/uploads/2014/04/Uma-abordagem-conceitual-das-nocoes-de-raca-racismo-dentidade-e-etnia.pdf


Resenha crítica produzida como atividade do componente curricular - Jornalismo e Cultura Brasileira ministrada pela profa. Helen Campos.


sexta-feira, 28 de maio de 2021

Resenha da letra e do clipe da música Boa Esperança do Rapper Emicida

Por Alexa Santa Rosa 


Brasileiro, nascido na grande São Paulo no ano de 1985, Leandro Roque de Oliveira (mais conhecido como Emicida), é um dos maiores Rappers do país. O nome artístico ‘’EMICIDA’’ veio da junção de ‘’MC’’ e ‘’Homicida’’, apelido ganhado pelas inúmeras vitórias quando ainda participava das batalhas de rap pelas ruas de São Paulo. 

Emicida é um artista completo e deu início a sua carreira em 2005. Em 2009, ele lançou o seu primeiro mixtape nomeado de “Pra quem já mordeu um cachorro por comida, até que eu cheguei longe”, onde continha 25 (vinte e cinco) músicas inéditas e a capa do disco foi desenhada por ele mesmo. 

Ao longo desses anos, Emicida já lançou vários outros álbuns que foram sucesso em todo o país e foi, inclusive, indicado ao Grammy Latino quatro vezes, saindo vencedor em uma dessas indicações pela categoria Melhor Álbum de Rock ou de Música Alternativa em Língua Portuguesa com o disco “AmarElo” em 2020. O rapper é conhecido na música por suas rimas e pelas suas letras fortes, onde, na maioria das vezes, fazem críticas e trazem questionamentos para vários problemas enfrentados por nós no nosso dia a dia, tais como: racismo, homofobia, sexismo, corrupção, injustiça e desigualdade racial e de gênero. 



Vídeo clipe e letra da música 

Com direção de Katia Lund e João Wainer, Emicida lançou, em 2015, o clipe da música composta por ele, titulado de “Boa Esperança”, onde na história do clipe, que tem a duração de mais de 7 minutos, ele aborda temas importantes que são ‘’esquecidos’’ ou ‘’ignorados’’, na maioria das vezes, pelas mídias e pela sociedade. O clipe se passa no condomínio luxuoso e traz o dia a dia do trabalho de funcionários, negros em sua maioria, em uma das mansões. Abordando a discriminação, o assédio e a humilhação perpetrada pelos patrões aos funcionários por causa da cor, classe social e, até mesmo, gênero sexual. Cansados dos tratamentos desumanos, os funcionários decidem fazer uma espécie de rebelião a fim de descontar as violências sofridas diariamente por eles. 

A história mostrada no clipe faz um casamento com a letra marcante da música. O trecho Favela ainda é senzala, JãoBomba relógio prestes a estourar” é retratada de uma maneira muito atual, uma vez que, no clipe, os papéis dos empregados são vividos por atores negros quase que em sua totalidade. Esse clipe, nos faz enxergar a realidade vivida por muitas mulheres negras, de baixa renda, analfabetas e periféricas que, por falta de melhores condições de vida, veem na casa dos ‘’brancos’’ a oportunidade de renda e, por isso, acabam por se submeterem às atividades humilhantes, vis e, muitas vezes, análogas ao trabalho escravo, no intuito de conseguir levar algum alimento para casa. 

Outro trecho importante da música é o “Por mais que você corra, irmão
Pra sua guerra vai nem se lixar”,
 onde, no clipe, podemos fazer a ligação com a dedicação das empregadas e a insatisfação da patroa com o trabalho feito por eles. Já, na vida real, podemos refletir esse trecho com os(as) vários(as) jovens periféricos(as) que concorrem a vagas de empregos e, muitas vezes, são eliminados porque não corresponderem aos padrões estéticos impostos pelas “normas da empresa”, normas essas que apenas refletem o pensamento de uma sociedade racista, gordofóbica, machista e misógina. Nesses casos, o que menos se leva em consideração é a capacidade do entrevistado(a). 

No trecho “Indenização? Fama de vagabundo”, nos leva a lembrar a cena do clipe onde a personagem vivida pela atriz, Gerônima Dias, que é uma empregada jovem, negra, vaidosa e bonita, que além de sofrer assédio de uns dos seus patrões é vista como vagabunda pela patroa que flagra o momento do assédio. Esse trecho da música nos leva a refletir sobre as várias situações vividas por jovens negros que, durante todo o procedimento investigativo do inquérito policial, são tratados como se culpados fossem e, durante o processo criminal, mesmo sem haver provas suficientes para uma condenação, são condenados injustamente. Um dos vários exemplos disso, é o caso de Gabriel Silva Santos, de 23 anos, que foi preso por Policiais Militares da Bahia no dia 12/05/2020 e a única prova que os policiais tinham, era que Gabriel era negro, de cabelo pintado de loiro e tatuado. Gabriel era estoquista e tinha acabado de perder o trabalho, tinha ido ao banco sacar o seguro-desemprego quando, na saída do banco, foi surpreendido por policiais que estavam atrás de um homem que tinha roubado um carro e estava cobrando dinheiro para devolver o automóvel. O único indício contra Gabriel era a descrição do ladrão como alguém negro, loiro e de tatuagens. Levado à Delegacia de Repressão à Furtos e Roubos de Veículos, foi colocado pelos policiais diante da vítima e do seu marido, que não o reconheceram

Agora saindo um pouco do contexto do clipe e avaliando a letra composta por Emicida, em uma das frases de ‘’Boa esperança’’, ele faz uma espécie de crítica à maneira que jovens negros são abordados pelos policiais no Brasil. “Silêncio e cara no chão, conhece?Perseguição se esquece? Tanta agressão enlouquece. ” Esse trecho, traz muito a luta dos jovens de baixa renda do país e que sofrem rotineiramente com as abordagens policiais nas periferias, onde muitas vezes sofrem com a perseguições e agressões gratuitas baseadas somente pela classe social ou pela sua cor. Já o trecho, “Vence o Datena, com luto e audiência” vem das reportagens feitas, na maioria das vezes, em operações policiais onde negros são assassinados brutalmente com transmissão ao vivo dos jornais sensacionalistas que fazem questão de passar a imagem do jovem negro como bandido, violento, reafirmando, com isso, a ideia presente no imaginário elitista-social de que todo preto - pobre é bandido, e por isso, merece o tratamento mais cruel possível. 

Atividade produzida no componente curricular - Jornalismo e Cultura Brasileira ministrada pela Prof.ª Helen Campos.

  

 

 

 

 

 

 

 

 

Encruzilhada: o espelho da realidade

 Resenha crítica sobre a peça teatral “Encruzilhada” de Leno Sacramento.


Por Rodrigo Veloso


No dia 8 de julho de 2017 o ator Leno Sacramento, do Bando de Teatro do Olodum, fazia a estreia da peça “Encruzilhada”, no Teatro Vila Velha, em Salvador. O monólogo tem como objetivo levar ao público diversas formas de preconceito que a sociedade desenvolve ao homem negro. Dentre elas, social, cultural, financeira, estética e psicológica.





No cenário, a peça é desenvolvida em uma estética densa, com luzes duras, e efeitos sonoros de tensão, no qual o personagem passa por diversas situações de preconceito no seu dia-a-dia: abordagens truculentas de policiais, preconceito em transporte público e vias públicas.

O que Leno não esperava era que, em menos de ano depois, a sua peça se transformaria em um acontecimento real.


Na tarde do dia 13 de junho de 2018, Leno foi surpreendido por um tiro de um policial, enquanto andava de bicicleta junto com um amigo, no centro de Salvador. Ele foi confundido por um assaltante, que também estaria de bicicleta pela região.

 

Geralmente, a arte tem o poder de tornar os acontecimentos - históricos ou não –, reais; através do teatro, do cinema, da literatura, etc. Mais ainda quando é retratado em espetáculos e peças muito bem feitas, como foi o caso da Encruzilhada. Mas o que aconteceu aqui foi o seguinte: a arte anteviu o acontecimento. 


Na mesma pele em que Leno, na dramaturgia mais que real da sua peça, dá pinceladas de emoções ao público presente, e conta o drama e história de milhares de pessoas, ele mesmo conta a sua própria história, que como em um presságio estará prestes a sofrer, e da pior forma. 

Infelizmente, nessa mesma cidade, onde residem mais pessoas negras no país, uma ocorrência de roubo pode ser fatal para uma pessoa negra. É absurdo, mas isso se diz respeito a maior parte da população da cidade.


Acontecimentos como esse ocorrem diariamente, à luz do dia, todos os dias, e em todos os lugares. Em uma tarde que era para ser tranquila, no centro de Salvador, em uma das ruas mais movimentadas da cidade, Leno só gostaria de ter chegado ao seu trabalho em paz.

Peças tão importantes e reais como a Encruzilhada deveria ser mais divulgadas, não só na cidade de Salvador, mas no mundo inteiro. A conscientização através da arte para combater o racismo e o preconceito, deveria ser exposta com mais veemência.


A arte tem o poder de combater e gritar o que está acontecendo com o povo, ela exterioriza a camada mais profunda e sombria que existe dentro da nossa sociedade. É impossível não levar em conta acontecimentos como esse - ainda mais quando acontece bem debaixo do nosso nariz, - e não ter outra postura e mentalidade na esfera tão profunda e real que é a do racismo.

Penso que se pode acontecer o que aconteceu com Leno, pode acontecer com alguém mais próximo a mim, como algum amigo ou esmo alguém da minha família. A cultura brasileira, baiana, soteropolitana é muito rica. Carregamos traços de um antepassado sofrido, que reflete até hoje na nossa sociedade.


O mais curioso é que o nosso povo é o mais sorridente e feliz do Brasil, mesmo passando tantas dificuldades. A arte não pode parar: para ascender ainda mais a cultura e história do nosso povo. E a luta tem que continuar: bem diante das nossas realidades teatrais.


Resenha crítica produzida como atividade do componente curricular - Jornalismo e Cultura Brasileira ministrada pela profa. Helen Campos.

 

 

 

 

 

A CULTURA BRASILEIRA E O NEGRO NA SOCIEDADE


Por Lívia Melo


A cultura retrata a diversidade de um povo formado por expressões, regras, normas, religiões, costumes, hábitos e crenças reproduzidas entre gerações por meio de construção de linguagem, portanto a partir da comunicação oral, escrita ou ainda pela imitação. A produção da linguagem atribui significados aos fatores raciais étnicos e comportamentais que unificam valores culturais dentro de uma sociedade. Na obra "Imagens de Controle" de Winnie Bueno é exibida a tradução sobre um dos conceitos de Patrícia Collins tratando - se da visibilidade do negro e as questões raciais. Discute assim, imagem representativas de mulheres negras, entre elas a da Mammys no clássico “E o Vento Levou” que reforça a construção da representatividade do negro na sociedade refletindo as condições que ele ocupa perante o sistema na atual situação racial brasileira. Nessa mesma linha Winnie Bueno destaca a ideia de (COLLINS, 2004, p.33) sobre a reprodução ideológica da mídia de massa na imagem de controle forjada dentro da própria mídia. Seja no jornalismo ou no entretenimento a cultura midiática é pensada de forma coletiva que sustenta a ideia de refletirmos sobre quem são as pessoas por traz das linhas editoriais, qual a ideologia incutida através da elaboração de um texto jornalístico e para qual tipo de público essa mensagem será direcionada, tais questionamentos são as construções das identidades sociais trabalhadas através das representações ideológicas do discurso midiático.



Historicamente a representação popular do homem e da mulher negra na sociedade brasileira vem estereotipada na manipulação ideológica induzida, coagida ou sugerida racista da elite proliferando o racismo.  O negro é privado de sua palavra, sua voz e colocado em desvantagem sem o seu direito participativo de cidadania e liberdade. A reprodução de mensagens subliminares através das novelas, programas de TV, música, internet e outros cria – se modelos de discursos ideológicos que geram arquétipos e atuam como controle social. Ao vermos Tia Anastácia na literatura de Monteiro Lobato, a “nega do cabelo duro que não gosta de pentear” num clássico da axé music, casa grande e senzala na história do Brasil, o termo pejorativo “macumbeiro” na religiosidade notamos os modelos discriminatórios e afirmativos da presença forte do racismo que simbolizam e atribuem sentidos de valores. Na luta pela igualdade temos a filha da ex – escrava e lavadeira Antonieta de Barros, nascida em 11 de julho de 1901 em Florianópolis, foi um marco nas lutas e conquistas da educação para todos, emancipação da mulher e valorização da cultura negra marcada pelo combate as questões raciais. Fundadora e diretora do Jornal A semana em épocas que a mulher não tinha livre expressão, contestou através de suas crônicas a condição feminina e o preconceito contrariando o discurso dos elitistas sobre o negro. Antonieta foi a primeira Deputada Estadual Negra na história do Brasil, suas ideias foram compiladas na obra Farrapos de Ideais (1937) retratando a alma feminina e salientando a imagem da mulher a uma "boneca - bibelot" de todos os tempos.  Ela sofreu um apagamento histórico que foi resgatado no final dos anos 90 pela ex- Senadora Ideli Salvatti. Juliana Domingos de Lima através do site UOL na coluna ECOA do dia 13 de março de 2021 mostra um pouco dessa trajetória. Outro exemplo de discriminação mais atual sofreu a atriz Cláudia Protásio ao filmar cenas de um filme no pátio do Comando Geral do Corpo de Bombeiros do Rio de Janeiro. 

Na reportagem do Fantástico de Giuliana Girardi vinculada ao canal do youtube no dia 01 de dezembro de 2019, Cacau chora ao relembrar os insultos sofridos após as gravações pelos membros da corporação que remetem aos crimes de racismo, gordofobia e homofobia. A reportagem mostra que na época do acontecimento com a atriz o jornalista Sérgio Nascimento é nomeado novo Presidente da Fundação Palmares. Sérgio polemiza sua chegada em destacar que a escravidão beneficia os descendentes de negros no Brasil, a atriz Claudia Protásio rebate no decorrer da entrevista questionando como o negro pode se sentir feliz sendo tratado de forma desumana, açoitado, descriminado e visto com indiferença até os dias atuais, reforçando que ela não se sente representada por ele.  A postura do jornalista levou a Diretora Executiva da Anistia Internacional Brasil Jurema Werneck se pronunciar e mostrar que pensar como Sérgio é não combater o racismo e deixar ele ser criado sem freio. A lei de crime ao racismo é a lei n° 7.716/89 aprovada em 1989, já a lei de igualdade racial esta prevista na lei 12.288 de 21 de julho de 2010 que impede a discriminação racial no país, com punição judicial e programas sociais de conscientização.  A visão massiva da mídia evidencia um critério do belo ser magro, olhos claros, cabelo liso desrespeitando as qualidades do negro. Uma das simbologias de representatividade da negritude esta na representação do cabelo Black Power, nas trancinhas, a cabeça raspada e os turbantes, formas impares de demonstrar a cultura africana, porém o olhar pejorativo sustenta o pensamento racista que segue dominante dentro da sociedade que se diz moderna, aderindo menor valor e agregando forma preconceituosa as qualidades ligadas ao negro. 

Mas como seria possível trabalhar o preconceito e combater a desigualdade entre negros e brancos atribuindo condições e oportunidades aos negros? São necessárias políticas públicas que divida as responsabilidades com o município, estado e governo. Produzir mais Trabalhos de valorização a cultura negra aderindo ações que diminuam a desigualdade social. Incentivar e apoiar programas que produzam projetos com um ciclo funcional e seqüencial. È necessário dar continuidade ao que se esta sendo colocado em prática assim é possível uma melhoria na valorização da cultura negra e o combate a desigualdade social no país. 

 REFERÊNCIAS:

 

BUENO, Winnie. Imagens de Controle: Um conceito do pensamento de Patrícia Hill Collins. Porto Alegre: Editora Zouk, 2020. 


Sites

https://www.uol.com.br/ecoa/stories/antonieta-de-barros-foi-a-primeira-mulher-negra-eleita-no-brasil/

https://pt.wikipedia.org/wiki/Antonieta_de_Barros

https://youtu.be/fWt_4sPdYEM

https://globoplay.globo.com/v/8070302

https://player.mais.uol.com.br/?mediaId=15664579&type=video


Trabalho apresentado no curso de Graduação de Comunicação Social com Habilitação em Jornalismo da Faculdade 2 de Julho, disciplina Jornalismo e Cultura Brasileira, ministrada pela professora Helen Campos.


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